Radares viram armadilha para motoristas na BR-040, em Minas
Falta planejamento, sensatez e respeito a vida dos condutores e familiares.
Parte dos equipamentos na BR-040 se tornou armadilha, na avaliação de especialistas. Muitos estão desligados ou instalados em locais inadequados
Publicação: 02/05/2012 06:54 Atualização: 02/05/2012 07:30
Radar atrás de árvore em uma reta do km 604 da BR-040, perto de Congonhas: no trecho, freadas bruscas e perda de controle de veículos são constantes
Sem controle, uma carreta desceu a estrada, atingiu o que estava pela frente e praticamente passou por cima de um carro que vinha no sentido contrário. Só parou em um barranco, depois de deixar um rastro de destruição e três mortos no km 604 da BR-040, em Congonhas, Região Central. O desastre ocorreu em janeiro do ano passado e levou o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit) a instalar um aparelho de registro de velocidade para reduzir acidentes no trecho, historicamente perigoso: só em 2011, num espaço de mil metros, quatro pessoas morreram e 11 se feriram em 12 batidas. Mas o que era para ser uma solução tornou-se uma armadilha.
O radar, instalado este ano em uma reta, ficou escondido atrás de uma árvore e obriga condutores que não o veem a frear de repente para reduzir a velocidade ao limite de 80km/h. Além disso, o equipamento não está ligado, o que faz alguns motoristas conhecedores do trecho acelerarem enquanto outros que não sabem disso freiam à sua frente, aumentando o perigo de batidas e perda de controle dos veículos. Desativados ou instalados em locais inadequados, muitas vezes sem que possam ser vistos com antecipação, parte dos novos radares tem se tornado um risco em Minas.
Recuperação em marcha lenta das rodovias federais
Dnit cancela todos os processos para restaurar rodovias federais em MG A forma como os radares estão instalados, sem uma sequência lógica de ritmo de viagem e em pontos de difícil localização, é perigosa, na avaliação de especialistas. “Temos que saber se o local onde está o aparelho exige uma redução de velocidade. Não adianta reduzir num trecho de reta, por exemplo, que não se justifica, como ocorre na BR-040”, aponta o mestre em engenharia e diretor da Locale Trânsito e Transporte, Paulo Rogério da Silva Monteiro. O especialista afirma que radares onde não há lógica para se reduzir a velocidade e escondidos se tornam armadilhas. “Em Conselheiro Lafaiete, há um radar em uma reta onde não há nada de diferente de um trecho anterior, onde uma velocidade maior é permitida. Portanto, se a situação é a mesma, por que colocar o radar? A pessoa tem de desacelerar bruscamente”.
As observações do especialista em transporte e trânsito são ilustradas pelos relatos de dor e prejuízos de quem vive perto dos trechos. Próximo à oficina onde trabalha o mecânico Uilker Lages, de 30 anos, no km 604 da BR-040, em Congonhas, as pessoas se assustam com os estrondos de batidas que sucedem ao barulho de freadas na área de registro de velocidade. “Quando assusta, o motorista está em cima do radar em uma reta e tem que reduzir a velocidade de uma vez”, descreve Uilker. “De repente, é aquele som alto. Quando corremos para ver, o que aparece é a fumaça preta do pneu travado”, diz Wanderson Lages da Silva, de 26, que também trabalha no local. “Mês passado, um carro desceu com tudo e travou na hora que viu o radar. O de trás não conseguiu parar e teve que ir para a contramão, batendo de frente no veículo que subia”, completa Jarbas Moraes, de 34, também funcionário da oficina.
Desligados
A quantidade de medidores de velocidade desligados também é apontada como problema e já provocou acidentes em rodovias federais. No dia 2 de abril, por exemplo, quatro carros e um caminhão se envolveram em acidente atribuído pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) a uma confusão provocada por radar desligado. Em Contagem, no km 522 da BR-040, um dos veículos diminuiu a velocidade por causa do aparelho e houve um engavetamento dos carros que estavam atrás. Cinco pessoas ficaram feridas.
Na BR-040, entre Belo Horizonte e Santos Dumont, nenhum dos 20 equipamentos registram multas. Segundo o Dnit, a situação não será resolvida até que uma empresa saia vencedora da licitação para operar o sistema que vai gerar as autuações e encaminhá-las aos motoristas. Enquanto isso, o trecho da estrada oferece risco. Alguns motoristas sabem que os radares não estão multando e, por isso, não respeitam os limites de velocidade impostos pelas placas. Outros condutores que desconhecem a situação acabam respeitando a sinalização e diminuem a velocidade. Um local onde isso ocorre é a descida do km 588, em Ribeirão do Eixo, distrito de Itabirito, na Região Central. Quatro placas seguidas anunciam que a velocidade permitida para o local é de 60 km/h, o que assusta vários motoristas por ser uma rodovia. De repente, numa curva brusca à direita, aparece um radar pouco visível. “O aparelho tem de reduzir a velocidade antes de uma curva perigosa e não no meio dela”, critica o especialista Paulo Monteiro.
Enquanto aguarda um serviço mecânico bem em frente ao equipamento, o caminhoneiro Edivânio Trindade, de 36, vê um festival de freadas que soam como buzinas. “Os motoristas das mineradoras que rodam aqui todos os dias sabem que o aparelho não funciona e não se preocupam em reduzir. Além disso, o radar está encoberto por uma árvore, que assusta ainda mais os que não conhecem o local. Imagina o que pode acontecer se um caminhão de minério pesado encontrar um carro pela frente?”, alerta.
Enquanto isso...aparelhos da 381 EM "EMERGÊNCIA"
Depois que o Estado de Minas mostrou, em agosto do ano passado, que 10 dos 18 radares instalados pelo Dnit não multavam e aumentavam risco de acidentes nos 100 quilômetros entre BH e João Monlevade por estarem desligados, o órgão contratou uma empresa em regime de emergência para gerenciar os aparelhos. A justificativa para a ação emergencial, com dispensa de licitação, é a necessidade de reduzir acidentes na rodovia que mais mata em Minas Gerais.
Pardais "cegos"
20 radares estão instalados na BR-040, entre BH e Santos Dumont, mas nenhum deles registra multas
24 radares estão entre BH e Curvelo; 18 não registram nada e seis estão desativados, com luzes intermitentes
BR-040 - apenas seis estão ativados
Concentrado no trabalho, o caminhoneiro Adriano Mendes da Silva, de 35 anos, amarrava na carroceria a carga de fibras de piaçava para vassouras que trouxe da Bahia. De repente, ele ouviu uma freada perto de onde estava, num posto da BR-040, seguida de uma batida entre duas carretas. Por causa do radar instalado há quase um mês, mas que ainda está desligado no km 522, em Contagem, um dos condutores do veículo pesado diminuiu a velocidade de repente e o que vinha atrás não conseguiu parar. “Foi uma armadilha. O da frente para e o de trás não consegue escapar. Corri com o pessoal do posto para ajudar porque o motorista que bateu ficou com as pernas presas e gemia, pedindo socorro”, lembra.
A história do caminhoneiro ilustra como a simples instalação de 24 radares na rodovia, sentido Brasília, não conseguiu prevenir os acidentes, mas tornou-os um ingrediente a mais de perigo à medida que alguns estão funcionando e a maioria não está. Desses aparelhos, apenas seis estão ativados. Os outros 18 não registram nada. No dia 2 de abril, o engavetamento naquele mesmo quilômetro envolvendo cinco carros foi testemunhado pelo frentista Edgard Alves Silva, de 43 anos. “O carro da frente brecou e o caminhão e os outros três carros foram batendo. A gente assusta, né? Sorte ninguém ter morrido ainda. Aqui sempre foi perigoso e o radar ajuda, mas tem de funcionar para não enganar o motorista”, considera.
Dos 18 que nada registram, seis estavam ligados, mas não registravam a velocidade. Apesar de suas luzes amarelas intermitentes indicarem que não estavam ativados, muitos motoristas reduziam temendo ser multados ou respeitando o limite menor de velocidade, enquanto outros que seguiam atrás faziam manobras bruscas para desviar deles e seguir em ritmo de viagem. Três aparelhos estavam simplesmente apagados, sem funcionar.
Em nove locais onde a sinalização alerta para a redução de velocidade, em vez de aparelhos, a empresa contratada pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) deixou apenas os postes onde serão afixados os aparelhos de registro de velocidade. Segundo o departamento, a sinalização é colocada antes para que o motorista se acostume com a redução de velocidade, quando o radar estiver funcionando. Porém, não é assim que os motoristas têm se comportado ao verem que não há perigo, principalmente os que diariamente trafegam pelo trecho. “Os medrosos, ou seja, os prudentes, reduzem, os corajosos, que são imprudentes, aceleram e essa é a fórmula dos acidentes”, compara o mestre em engenharia e diretor da Locale Trânsito e Transporte, Paulo Rogério da Silva Monteiro.
Localização Para a Polícia Rodoviária Federal (PRF), a culpa pelos acidentes não é dos radares. Um agente que trabalha na BR-040 diz que a simples presença do aparelho já serve para educar o motorista. “Se acompanhar as placas, ele vai saber que tem que manter aquela velocidade. Fazendo isso, quando visualizar o radar, já vai estar na velocidade adequada”, avalia o policial. Mas ele admite que alguns radares não estão posicionados nos melhores pontos para evitar acidentes. “Existem trechos mais complicados que mereciam uma atenção maior. Já outros, têm o radar, mas não são locais que precisem tanto”, diz.
A assessoria de comunicação do Dnit em Minas Gerais informou que todos os 20 radares entre BH e Santos Dumont estão registrando as velocidades dos motoristas. Segundo o órgão, assim que a empresa que vai operar o sistema das autuações assinar o contrato, ela poderá recorrer ao banco de dados e emitir as multas para todos os motoristas flagrados acima da velocidade nos 30 dias anteriores à assinatura do termo. Depois de assinado, o contrato terá vigor por 540 dias. As propostas foram abertas em 20 de abril, porém, ainda não há resultado definitivo
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