Paula Sarapu
Jefferson da Fonseca Coutinho - Estado de Minas
Publicação: 21/10/2012 07:07 Atualização: 21/10/2012 08:20
Empresário durante aula de tiro em Belo Horizonte: procura pelos cursos aumenta, especialmente entre pessoas que já foram vítimas de violência |
No ano passado, segundo a PF, 223 documentos foram emitidos em Minas, número que vem crescendo há três anos, apesar das campanhas de desarmamento. Desde 2009, quando a Delegacia de Controle de Armas e Produtos Químicos passou a catalogar as estatísticas referentes às solicitações de porte, 766 pedidos foram feitos no estado. O Exército, por sua vez, controla as autorizações para a prática de tiro esportivo, com avaliações a cada dois anos e uma série de exigências de documentos, aptidões e certificados.
Favorável ao controle rígido, o economista Gustavo Calixto defende que todo cidadão de bem, “devidamente treinado”, deveria fazer valer seu direito à autoproteção. Especialistas em segurança, porém, desaconselham e usam estatísticas para alertar que ter uma arma muitas vezes aumenta o risco em caso de um episódio violento. E a PF é criteriosa: do total de pedidos de 2008 a 2011, 86,2% (661) foram indeferidos. Mas há uma parcela invisível de cidadãos que mantêm armamento mesmo sem autorização oficial. É o que admite o próprio Gustavo, afirmando conhecer também “cidadãos trabalhadores armados” sem registro. “Conheço muitos”, afirma, arriscando um percentual de 50% do total.
A motivação da maioria dos que se armam é a mesma de Rossi, um empresário de 53 anos que mora na Pampulha e pede para ter a identidade preservada, ao afirmar ter se tornado atirador por necessidade. “Fui assaltado cinco vezes. Na última, ameaçaram minha família. Cansei de esperar que o poder público fizesse o que já está mais que comprovado que ele não dá conta”, desabafa. Para Rossi, o desarmamento precisaria começar pelos criminosos e não pelos cidadãos honestos. “É uma hipocrisia. Os bandidos invadem essa quantidade de casas e empresas, como a gente vê todos os dias nos jornais, roubam, fazem o que querem da sociedade, porque sabem que não vão encontrar perigo. Na minha casa, na minha empresa, bandido não é bem-vindo. É recebido à bala.”
COVARDIA
Com revolta, o empresário recorda o assalto que sofreu, quando foi rendido por dois homens no escritório, em uma manhã de sábado. “Eles passaram quase uma hora na empresa. Foram covardes, atiraram no meu funcionário à toa, me deram uma coronhada, levaram tudo e até hoje a polícia não dá nem notícia”, critica. Em uma espécie de desafio, Rossi acrescenta que quando a polícia desarmar os bandidos ele será “o primeiro pai de família a entregar as armas”.
Para o especialista em segurança Alexis Pettersen, de 47, instrutor e competidor com mais de 10 mil tiros disparados por ano, a principal defesa não vem da arma, mas sim do comportamento, das medidas particulares e dos cuidados de cada cidadão. “O que pode proteger é a antecipação dos fatos. O armamento é um complemento.” Criterioso, ele separa a prática esportiva da defensiva. E, por conhecer as polêmicas que envolvem o assunto, defende que a arma precisa ser “desmistificada”.
“Não tenho nada contra as pessoas conhecerem as armas. Elas podem muito bem praticar em um clube de tiro, sem terem uma arma em casa. E se o indivíduo estiver apto, que tenha uma arma legalizada, de acordo com as regras da PF ou do Exército. É um direito de todo cidadão. Por que não?”, questiona o fundador do Clube Tiro Urbano. Com experiência internacional em defesa pessoal, Alexis diz que o armamento para a defesa do cidadão é um “último recurso”. Bem antes da arma de fogo, ensina, vem a preocupação de “estar sempre atento”, com cuidados permanentes para não dar chance ao azar.
O instrutor cita exemplos de práticas cotidianas, como prestar atenção ao estacionar ou voltar ao carro, ter cuidado redobrado ao abrir e fechar portões e ter consciência de que ostentar riqueza aumenta a exposição de qualquer pessoa. “A pessoa diz: ‘Mas eu trabalhei tanto e não posso ter um carro caro...’ e fica irritada. Lamento. Não que ela não possa ter um carro de luxo. Mas é importante que ela saiba que isso é um atrativo. E que vai exigir ainda mais a atenção dela”, considera. Armado, com faca e pistola automática, Alexis jamais se senta de costas para portas. Comportamento que esteve evidente durante a conversa com a equipe do Estado de Minas, durante a qual o entrevistado manteve o olhar atento a todo e qualquer movimento no ambiente.
NÚMEROS
406%
foi o aumento na concessão de porte de armas em território mineiro de 2008 a 2011
59 milhões
de eleitores (63,94% dos votos) foram contra a proibição do comércio de armas e munição no plebiscito de 2005
43,3 mil
armas legais foram comercializadas em Minas de 2005 a março de 2010, média de 23 por dia. No país, foram 635 mil
45,8%
foi quanto cresceu o comércio de armas legalizadas em território mineiro em seis anos, segundo o Exército
658
vítimas de armas de fogo foram atendidas no HPS de BH entre janeiro e agosto. 90% dos assassinatos na Grande BH são cometidos a tiros
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